quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Iémen. A luta para banir o casamento infantil num dos países árabes mais pobres




Responsável dos direitos humanos quer impor 18 anos como idade mínima para o casamento

A forte indignação com que por todo o mundo foi recebida a notícia da alegada morte, no Iémen, de uma menina de oito anos em consequência de ferimentos que sofreu na primeira noite da sua lua--de-mel com um homem cinco vezes mais velho criou condições, segundo a responsável dos direitos humanos do país, Hooria Mashhour, para que a prática do casamento infantil seja de uma vez por todas banida.
Identificada apenas como Rawan, a menina vivia em Meedi, uma cidade na província norte-ocidental de Hajjah, perto da fronteira com a Arábia Saudita, e foi entregue pela sua família a um homem mais velho, em troca de dinheiro. De acordo com os relatos de alguns residentes aos meios de comunicação locais, a causa da morte de Rawan foi hemorragia interna, que terá resultado de relações sexuais que lhe rasgaram o útero e outros órgãos internos. Contudo, assim que a notícia começou a ter repercussão nos media internacionais, as autoridades locais vieram negar a veracidade da história.
Mohammed Ahmed, chefe do departamento de polícia local, garantiu que tudo não passava de relatos "infundados". "As pessoas ouviram a história umas das outras e esta espalhou-se rapidamente, como um rumor", explicou, acrescentando que o pai de Rawan fora chamado a prestar declarações na delegacia da cidade e negou o incidente.
Entretanto, a CNN contactou vários residentes que, sob condição de anonimato, por receio de virem a sofrer represálias, afirmaram que lhes tinha sido ordenado pelas autoridades que parassem de discutir o caso com os media. "Ninguém está a falar sobre a história porque é motivo de grande embaraço, mas é isto que a pobreza leva as pessoas a fazer", disse um dos residentes.
Quando o debate começava a centrar--se cada vez mais no confronto entre as alegações que confirmavam ou contrariavam a versão inicial da história, Mashhour disse à CNN que o importante era que este caso representava uma oportunidade para o Iémen corrigir uma prática indefensável. "Esta não é a primeira vez que um casamento infantil acontece no Iémen, pelo que não nos devemos focar apenas neste caso. Muitas crianças casam-se todos os anos no Iémen. Está na altura de pôr um ponto final nisto", disse Mashhour.
Na sociedade profundamente conservadora e tribal do Iémen, a questão do casamento infantil não só é controversa como extremamente problemática. De acordo com dados da Organização das Nações Unidas, mais de metade de todas as jovens iemenitas estão casadas antes de completarem 18 anos, com cerca de 14% a casar sem terem ainda 15 anos.
Na esteira do caso de Rawan, o grupo Human Rights Watch apelou ao Iémen para que "proteja as suas crianças dos efeitos devastadores do casamento precoce, estabelecendo os 18 anos como idade mínima na lei". O grupo acrescentou que "a actual transição política e o processo de elaboração de uma nova Constituição representa uma oportunidade única para o governo iemenita promulgar leis que protejam os direitos das crianças".
Em 2009, o parlamento chegou a votar favoravelmente uma lei que elevava a idade mínima do casamento para os 17 anos, mas os deputados mais conservadores organizaram-se numa campanha que defendia que aquele diploma violava a lei islâmica, a qual não estipula uma idade mínima para o casamento. Em consequência, o projecto de lei nunca chegou a ser assinado.
Grupos de activistas no Iémen permanecem empenhados no esforço de tentar mudar a lei, mas mais de cem líderes religiosos continuam a atacar esta proposta por ser "anti-islâmica".

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