terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Em 60 denúncias à Linha das Crianças Desaparecidas 24 são de rapto parental

O presidente da Associação Igualdade Parental e Direitos dos Filhos lamenta que muitos casos não se resolvam e alerta para o aumento de situações de ida para o estrangeiro devido à crise.
Crianças com dupla nacionalidade e progenitores em conflito correm mais risco Adriano Miranda
Em 60 casos de denúncias registadas pela Linha das Crianças Desaparecidas, 24 foram raptos parentais, o que corresponde a 40% das situações. Os dados são de 2013 e foram divulgados pelo Serviço de Denúncias do Instituto de Apoio à Criança, SOS Criança. O presidente da Associação Igualdade Parental e Direitos dos Filhos, Ricardo Simões, sublinha, no entanto, que estes dados representam apenas uma parte da realidade e que, no geral, “as estatísticas são insuficientes para se perceber este fenómeno”.
De acordo com os dados publicados no Boletim do Centro de Estudos, Documentação e Informação sobre a Criança do Instituto de Apoio à Criança, das 24 crianças envolvidas nos casos de rapto parental, actualmente apenas três são dadas como aparecidas, continuando 21 registadas como desaparecidas.
“Infelizmente, as coisas não se resolvem. Há demora em agir, porque há aquela ideia de que estão com o pai ou com a mãe e que estão bem. A mensagem que se passa é a errada, é a de que se pode raptar a criança e não se passa nada”, lamenta Ricardo Simões.
O rapto parental refere-se, esclarece-se no boletim, ao acto de uma criança ser levada ou mantida num local ou país diferente do da sua residência habitual, por um ou ambos os progenitores ou detentores da sua guarda contra a vontade do outro progenitor ou detentor da sua guarda.
As crianças que correm mais risco são, entre outras, as que têm dupla nacionalidade e aquelas cujos progenitores estão em conflito parental. Ricardo Simões acrescenta que actualmente, devido à crise, há cada vez mais casos de casais que se separam e um dos progenitores vai para o estrangeiro com a criança. Por vezes, o outro membro do casal sabe em que país ou cidade está a criança, embora não tenha contacto com ela, mas também há casos de pais que não sabem.
“Hoje em dia, para além de situações de casais de diferentes nacionalidades que se divorciam e um dos membros vai para o país de origem com a criança, há cada vez mais casos ligados à questão económica. Um dos pais não tem emprego em Portugal e vai lá para fora, sem atender à vontade da criança e do outro progenitor”, conta Ricardo Simões.
De acordo com os dados recolhidos através da linha 116000, no que toca à situação jurídica dos pais, há seis casos de pais divorciados, cinco separados, dois solteiros, quatro uniões de facto, dois casados, e quatro não identificados. Quanto à regulação das responsabilidades parentais, em 13 casos não estava regulada. Ricardo Simões insiste na importância da regulação das responsabilidades parentais, uma vez que, sem ela, a situação do progenitor que está sem contactar com o filho fica “fragilizada”. “Um dos problemas que temos na associação é este. É importante haver a regulação, porque caso não haja, a situação jurídica complica-se e os pais ficam desesperados, sem saber o que fazer”, diz.
Apesar de no ano passado a SOS-Criança ter registado 32 casos, Ricardo Simões não acredita que os dados deste ano indiquem uma diminuição no número total de situações. “Há muitos mais casos do que aqueles que aparecem nas estatísticas das organizações”, diz, recordando que, em 2012, cerca de metade dos 533 crimes de subtracção de menor registados pelas autoridades policiais e divulgados pela Direcção-Geral de Políticas de Justiça (DGPJ) serão raptos parentais de crianças que vão para outro país. Os dados da DGPJ, referentes a 2013, serão conhecidos em Abril.
Ainda de acordo com os dados do boletim, dos 24 casos, 16 foram denunciados por telefone e oito por email. Quanto à idade das crianças, a faixa etária que vai do primeiro ano de vida até aos 3 anos regista 10 casos. Segue-se a faixa etária dos seis aos 10, com seis situações; dos quatro aos seis, com quatro denúncias; dois casos com mais 10 anos e dois em que a idade não está identificada.

Violência conjugal. As famílias infelizes têm histórias horríveis




Por detrás dos números da violência doméstica estão os testemunhos das mulheres que levaram os maridos a tribunal
No ano passado, 7271 mulheres foram vítimas de violência conjugal - mais 1138 casos que em 2012. Números são números. Todas as semanas há pelo menos cinco ou seis a chegar aos tribunais. Lurdes, Rosa, Vitória e Margarida (nomes fictícios) deixaram de ser números em Janeiro e Fevereiro. Os seus testemunhos e os dos agressores estiveram na origem de sentenças que provam que um número nunca é só um número. Aníbal ouviu a condenação contrariado: dois anos e quatro meses de prisão. A pena fica suspensa se frequentar sessões de terapia para se curar do vício da bebida. Tem de mostrar ainda empenho em procurar trabalho.
O que fez é tão grave? - perguntou ao juiz. Afinal, todos os casais têm problemas. E as mulheres são dramáticas. Dizem que se querem matar, mas neste caso, ninguém consegue provar que a culpa foi dele. Nunca lhe bateu. Nunca. O seu único pecado foi deixar-se consumir pela bebida. Lá porque um juiz diz agora que o seu comportamento foi um "massacre psicológico" sobre a mulher, isso não faz dele um criminoso. Alcoolismo, que se saiba, não é crime. Podem vir agora com argumentos da treta, que não o convencem: "A soma das suas pequenas acções desembocaram num crime de violência doméstica, nomeadamente em maus-tratos psíquicos", diz o acórdão da Relação de Évora. Conversa de psicólogos. Onde está esse massacre, se não há nódoas ou cicatrizes para mostrar?
Aníbal está casado com Vitória há 30 anos. Nem se lembra quando passou a beber todos os dias, várias vezes ao dia. Se calhar foi há uns dez anos. Ou há mais tempo. Sempre que está bêbado começa a ladainha. A filha não é dele, a mulher tem um amante e pode ir ter com ele, é igual ao litro. Se ela está a dormir, liga o televisor, no volume máximo, bate com as portas e pragueja. Se Vitória sai de casa bem arranjada, arranja-se para quem? Para ele é que não é.
Foram uns oito ou nove anos a moer-lhe a paciência. Até julgar que a solução para um casamento sem solução está num boião de comprimidos.

Insultos e agressões fizeram parte da vida de João durante 20 anos



22 de Fevereiro, 2014
Cenas de ciúmes constantes, depois insultos, humilhações, até às agressões físicas, numa relação de cedência permanente, levaram João, professor universitário, a ser um dos poucos homens a assumir-se como vítima de violência doméstica.João Paiva conheceu Fernanda ainda no 9.º ano, tinham então 13 anos. Reencontram-se na faculdade e começam a namorar aos 19, vivendo uma relação que haveria de terminar quando ele já tem 40 anos, recheada de episódios de "manipulação" e de "violência psicológica forte".
As cenas de ciúmes apareciam com "muita frequência" e com elas vinham também o isolamento e o afastamento da família e dos amigos mais próximos.
Quando a filha tinha cinco anos, passam por uma primeira "grande crise" e o facto de Fernanda estar "sob muito 'stress'" para entregar a tese de doutoramento foi servindo de desculpa para João "ignorar o tratamento inadmissível" a que foi sujeito.
A socióloga Cláudia Casimiro, com investigação feita na área da violência feminina, explicou à Lusa que a violência praticada pelas mulheres é mais escondida e feita de uma forma gradual, podendo passar por isolar o marido da família ou dos amigos, chantagear, humilhar, rebaixar, por a sua masculinidade em causa.
"Toda a minha vida foi de cedências e quando olho para trás, vejo que essa cedência não acontecia de uma forma inocente. Era-me feito sentir que eu tinha de ceder. As prioridades dela estavam primeiro, mas depois eu era tratado como se não tivesse querido fazer ou não tivesse sido capaz", adianta o João.
João chegou até a abdicar de uma bolsa de doutoramento na Suíça. Noutra altura, aceitou prescindir de quase 90% do ordenado para ser Fernanda a gerir.
À Lusa, Luísa Waldherr, psicóloga clínica da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), explicou que a dinâmica da mulher agressora passa pela violência psicológica.
"A certa altura, a auto-estima está de tal forma em baixo, eles entram em processos depressivos e, a partir daí, é relativamente fácil passar à agressão física porque ele deixa de ter força anímica para resistir", adiantou.
E foi isso que aconteceu com João: durante 2008, o mau estar acentua-se e as humilhações e os maus tratos aumentam, tendo havido "sessões de maus tratos físicos". Tudo isto dentro da sua própria casa e numa das situações à frente da filha menor.
Certa noite, depois de mais uma discussão, João sai para apanhar ar. Quando volta encontra a porta trancada. Minutos depois chega uma brigada da GNR porque Fernanda tinha apresentado queixa por violência doméstica. Separam-se, mas os problemas estão longe de acabar.
A partir daqui, vêem as dificuldades para conseguir estar com os filhos, ao mesmo tempo que João se apercebe que Fernanda vai minando a relação dos filhos com o pai.
Depois, vem a violência física, quando João se confronta com Fernanda em casa de uma amiga comum.
"Chega e começa a insultar-me", recorda. João tenta responder, mas Fernanda não quer ouvir. A amiga pede-lhe que o oiça, mas leva um grito como resposta e quando João sugere que a mulher precisa de "outro tipo de tratamento" leva com um soco na cara.
Recua, tropeça e cai de costas. "Ela vem a correr em direcção a mim e começa a pontapear-me e eu fico ali a levar pontapés no tórax, na cabeça".
João apresenta queixa na polícia, mas Fernanda também. Ambos recebem assistência hospitalar. Cerca de seis meses depois são chamados pelo Ministério Público. São constituídos arguidos por ofensas à integridade física.
Depois de um julgamento "muito demorado", que começa em Dezembro de 2012, a leitura da sentença sai em Julho: "Sou ilibado de tudo o que era acusado e ela é condenada".
O julgamento terminou, mas as agressões continuam porque Fernanda "faz agressão psicológica através dos dois filhos".
Desde essa altura que João não está com a filha mais velha. Em relação ao filho mais novo a guarda é partilhada.
"Vou fazendo tudo o que posso pela minha filha. Enquanto tiver forças. Mas já são poucas".
Hoje assinala-se o Dia Europeu das Vítimas de Crime.
Lusa/SOL

Violência doméstica: Mais homens pedem ajuda, mas vergonha impede queixa



22 de Fevereiro, 2014
Quase 400 homens pediram ajuda à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) em 2013 por serem vítimas de violência conjugal, mas a vergonha justifica que só uma ínfima parte avance com o processo para o Ministério Público.Segundo os dados mais recentes da APAV, em 2013 registaram 7.271 vítimas de crimes de violência doméstica. Destas, 1.024 eram homens e dentro deste grupo estavam 618 homens com 18 ou mais anos.
"Destes 618 homens adultos, 381 era vítimas de violência conjugal", refere a APAV.
Em declarações à Lusa, Luísa Waldherr, psicóloga clínica da APAV, disse que a associação tem notado que nos últimos anos o número de homens que pede ajuda tem aumentado, "embora de um modo um bocadinho envergonhado".
Um estudo das investigadoras Andreia Machado e Marlene Matos, da Universidade do Minho, feito em 2013 com 1.557 homens, mostrou que 69,7% tinha sofrido pelo menos um comportamento abusivo nos 12 meses anteriores ao inquérito e 76,4% sofreu pelo menos um comportamento abusivo ao longo da vida e 59,7% dos homens disse ter sofrido uma agressão psicológica.
Cláudia Casimiro, investigadora na área da violência feminina, defendeu que a violência que as mulheres exercem é ou pode ser a mesma que os homens, mas admitiu que "há uma espécie de tabu sobre a mulher violenta", havendo, por isso, pouca investigação nesta área.
Segundo a socióloga, a violência praticada pelas mulheres é mais sub-reptícia e é feita de forma mais gradual junto do marido ou companheiro.
"Pode corresponder a múltiplas formas, como isolar o marido da família ou dos amigos, fazer chantagem, humilhá-lo, por exemplo, em frente a familiares ou amigos, rebaixá-lo, dizer que ele, comparativamente a outros colegas, ganha pouco, tem um trabalho desqualificado, que não serve para nadam, por a masculinidade em causa, etc.", explicou.
Um dos problemas da violência psicológica é que não deixa marcas tão visíveis como um braço partido ou um hematoma e não tem, por isso, consequências imediatas, indica.
Opinião partilhada pela psicóloga clínica Luísa Waldherr para quem o homem, enquanto agressor, utiliza mais a força física, enquanto a mulher a violência psicológica.
"A mulher começa por desvalorizar o companheiro, desvalorizar as suas acções, agride mais ao nível da auto-estima, das suas capacidades enquanto homem", disse.
Da desvalorização é fácil passar à agressão física e Luísa Waldherr explica que a certa altura a auto-estima do homem está de tal forma em baixo e entra num processo depressivo tal, que é "relativamente fácil" que a mulher o agrida.
E isto faz com que os homens demorem mais tempo a tomar consciência da agressão e a apresentar queixa, explica.
Apenas 8,9% dos 1.557 homens se assumiram como vítimas, segundo a Universidade do Minho.
Com a dificuldade em assumir-se como vítima, vem a dificuldade em fazer queixa e Luísa Waldherr revela que a maior parte dos homens que recorre à APAV o faz porque estão a entrar em processos depressivos e procuram ajuda e que apenas 2% formaliza a queixa.
Para a responsável, este número tão baixo está directamente ligado à vergonha que o homem sente ao ter de admitir que foi violentado ou abusado de algum modo, o que o faz sentir diminuído perante a sociedade e os seus pares.
Segundo a responsável pela Unidade de Combate à Violência Doméstica/Gabinete de Informação e de Atendimento à Vítima, do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, as queixas apresentadas por homens por violência conjugal "é residual".
"Temos duas mulheres em prisão preventiva por violência doméstica física grave" e "foi deduzida uma acusação em Dezembro passado contra uma mulher por violência doméstica praticada na pessoa do seu namorado", disse a procuradora Maria Fernanda Alves, em resposta escrita.
Dos homens inquiridos no estudo da Universidade do Minho, 76,4% não pediu ajuda e entre os que o fizeram, 71,4% recorreu à ajuda de amigos. Dos que recorreram à ajuda das forças de segurança (14,3%), 83,3% disse que essa ajuda não teve qualquer utilidade, havendo igual percentagem que teve a mesma opinião em relação ao sistema de justiça.
Entre 2012 e 2013, as queixas apresentadas à GNR sofreram um aumento de 0,8%, passando de 1.677 no primeiro ano para 1.690 o ano passado.
Hoje assinala-se o Dia Europeu das Vítimas de Crime.
Lusa/SOL

Mais de 300 mil com mais de 60 anos foram vítimas de violência



25 de Fevereiro, 2014
Um estudo sobre a violência revela que 12,3% da população portuguesa, com 60 ou mais anos - cerca de 314 mil pessoas -, foram vítima de, pelo menos, uma "conduta de violência" por parte de um familiar, amigo, vizinho ou profissional.O ‘Estudo populacional sobre a violência’, baseado numa amostra de 1.123 pessoas, faz parte do Projecto Envelhecimento e Violência 2011-2014, do Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge (INSA), cujos resultados estão a ser divulgados e debatidos hoje, no seminário 'Envelhecimento e Violência', que está a decorrer na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
Este estudo teve como objectivo estimar a prevalência de pessoas com 60 e mais anos na população portuguesa sujeita a violência (física, psicológica, financeira, sexual e negligência), em contexto familiar, nos 12 meses anteriores à entrevista, assim como reconstituir a lógica e as condições de ocorrência de tais situações no contexto da vida familiar.
O número de vítimas de violência foi estimado com base num inquérito telefónico aplicado à população portuguesa com 60 e mais anos.
Para aprofundar o conhecimento constituiu-se paralelamente uma amostra de vítimas de crime e violência com 60 e mais anos, que foram sinalizadas pelas entidades parceiras.
"Estimou-se que 123 em 1000 pessoas com 60 e mais foi vítima de alguma forma de violência (física, psicológica, financeira, sexual ou negligência)", referem as principais conclusões do estudo coordenado pelo Departamento de Epidemiologia do INSA, a que a agência Lusa teve acesso.
Dos cinco tipos de violência avaliados (física, psicológica, financeira, sexual ou negligência), destacam-se a violência financeira e a violência psicológica: 6,3% da população com 60 e mais anos (cerca de 160 mil pessoas), em ambos os casos, dizem ter sido vítima de, pelo menos, uma conduta destes tipos de violência.
Já 2,3% dos inquiridos (58 mil pessoas) foram vítima de, pelo menos, uma conduta de violência física.
Os crimes menos frequentes foram a negligência (0,4% da população com mais de 60 anos) e a violência sexual (0,2% ).
O projecto identificou diferentes agressores, de acordo com os tipos de violência.
Na violência financeira, os principais agressores foram os descendentes, nos quais se incluem filhos, enteados e netos, seguidos dos outros familiares, como cunhados, irmãos e sobrinhos.
São também outros familiares os principais agressores reportados pela vítimas de violência psicológica, seguidos dos cônjuges e de actuais e ex-companheiros.
Mais de metade das condutas de violência física foram da responsabilidade de cônjuges e de actuais ou ex-companheiros.
O estudo adianta que, do total de vítimas, somente um terço denunciou ou apresentou queixa sobre a situação de violência vivida e, quando procurou ajuda, a maioria dirigiu-se às forças de segurança (PSP ou GNR).
Embora com menor frequência, as vítimas também denunciaram a sua situação de vitimização a elementos da rede social informal (familiares, amigos, vizinhos e colegas de trabalho) e a profissionais de saúde.
O Projecto Envelhecimento e Violência 2011-2014, do Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge, compreendeu ainda outro estudo sobre violência, também em contexto familiar.
Os dois estudos "são indicativos da relevância que o problema tem na sociedade portuguesa e os resultados demonstram que as vítimas de violência que residem na comunidade são sobretudo vítimas das famílias, seja alargada ou nuclear", refere o programa.
O Projecto tem como entidades parceiras o Centro de Estudos de Sociologia da Universidade Nova de Lisboa, com Instituto Nacional de Medicina Legal, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, o Instituto da Segurança Social e a GNR.
Lusa/SOL

10 anos de prisão para homem que violou e engravidou filha de 14 anos

O tribunal de Penafiel condenou hoje a 10 anos de prisão o homem acusado de ter violado e engravidado a sua filha de 14 anos.O colectivo considerou ter ficado provado "o grau de ilicitude elevadíssimo do arguido", condenando-o pela prática de um crime de abuso sexual de criança dependente agravado".
"Não é normal um pai engravidar uma filha", observou o presidente do colectivo, considerando "repugnantes" os actos de que estava acusado o arguido.
O tribunal censurou o facto de o arguido nunca ter admitido, em audiência, os abusos sexuais sobre a filha praticados pelo menos entre Janeiro e final de Março de 2013, quatro a cinco vezes por semana, numa habitação em Rio de Moinhos, Penafiel.
Como atenuante para a medida da pena, o tribunal considerou a condição social débil do arguido, as baixas habilitações e o facto de sofrer de algumas perturbações psíquicas, com duas tentativas de suicídio.
Após a leitura do acórdão, ainda na sala de audiências, o arguido sofreu uma crise de epilepsia.
Lusa/SOL

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Sim, vou deixar-te morrer"

— Que Deus ilumine as pessoas que estão a criar esta lei da eutanásia para crianças e as faça desistir — pediu o padre.
— Não, meu Deus, não posso desejar isso. O que mais lamento é que o Tomás tenha sido obrigado a passar por aqueles três últimos dias — pensou para si.
Num destes domingos, no final da missa, Vanda voltou a recordar o dia em que levou o filho ao hospital para morrer. Sabia que aquele bebé de um ano e meio, a quem já nem sequer podia pegar ao colo, não era mais o seu Tomás. Olhava e via um corpo minúsculo e inchado, pálpebras fechadas, deitado numa maca, a gemer sempre que lhe tocavam e com dificuldade em respirar. “Nunca mais acordou, nunca mais abriu os seus olhos grandes, nunca mais sorriu. A dor já tinha tomado conta dele. Se logo nesse dia tivessem dado alguma coisa para ajudar o meu filho a partir... Foram mais de 48 horas. Ouvia as máquinas constantemente a apitar e só tinha vontade de puxar aqueles fios todos para que tudo acabasse o mais depressa possível.” A médica já estava com uma injecção na mão quando o coração de Tomás bateu pela última vez. “Sabia que era proibido, mas ia ficar só entre nós. Acabou por não ser preciso”, confessa Vanda Alcobia, portuguesa, 40 anos, emigrante na Bélgica há 15.
Tomás só vomitava e dormia. O pediatra dizia que era do leite mas decidiu fazer-lhe uma radiografia ao cérebro, “por descargo de consciência”. “Comecei a achar que o exame estava a demorar muito tempo, quando fui tentar perceber o que se passava, vi cinco médicos, muito sérios, a olhar para o ecrã onde aparecia o interior da cabeça do meu filho. Percebi logo que alguma coisa não estava bem”, conta Vanda. O pediatra pediu-lhe que descesse até ao seu gabinete. “Mas passa-se alguma coisa, doutor? É grave, não é?” “A Vanda vai ter de ser forte...” O diagnóstico foi o pior possível: um cancro no cérebro, nível 5, todos os ossos da cara do bebé tinham metástases.
Foi operado de urgência. Os médicos retiraram-lhe metade do tumor mas não conseguiram evitar que acordasse tetraplégico. Decidiram que o melhor seria não prosseguir com os tratamentos. Vanda e o marido disseram que não, isso nunca — ir para casa esperar a morte, nunca. “Como é que eu podia olhar para o meu filho e pensar ‘sim, vou deixar-te morrer’?” “Por favor, vamos tentar apenas o primeiro ciclo de quimioterapia, o Tomás é forte”, pediram aos médicos. E era. Entre 31 de Março e 7 de Setembro de 2011, o dia em que viria a morrer, um corpo pequeno e molinho, com cheiro a creme Mustela, aguentou duas operações, quatro ciclos de quimioterapia e injecções, tantas que Vanda lhes perdeu a conta.
A mãe que quis tentar um milagre para salvar o filho foi a mesma que, nos seus últimos três dias de vida, pediu a Deus, com todas as forças que tinha, para o levar. “As pessoas têm teorias sobre tudo mas ninguém consegue imaginar o que é olhar para o nosso bebé e só ver sofrimento. Ai, é uma dor tão grande, tão grande. Sentimo-nos inúteis, não sei explicar, mas é como se não valêssemos nada.”
“Voluntário, reflectido e repetido várias vezes”
Na Bélgica, desde 2002, é legal pôr fim à vida de um adulto que peça para morrer. Agora, a lei da eutanásia foi alargada a menores de 18 anos. O acto tem ser praticado por um médico e o menor deverá encontrar-se numa situação terminal (com dias ou poucas semanas de vida) e ser vítima de “um sofrimento físico constante e insuportável que não possa ser apaziguado”. O pedido para morrer tem de ser “voluntário, reflectido e repetido várias vezes” e a sua capacidade de compreender o que significa uma eutanásia atestada pela equipa clínica que o acompanha (enfermeiros, médicos, psicólogos) e por um psiquiatra infantil. O consentimento dos pais ou representantes legais é obrigatório. 
Regras mais restritas do que as aplicadas aos adultos — que não precisam de estar num estado terminal ou ter um problema físico. Neste caso, a dor psicológica é levada em conta de igual forma. Para menores e maiores de idade, a condição fundamental é que o acto seja requerido pelo doente, sem qualquer pressão externa. Quando todas as partes envolvidas assinam o acordo de eutanásia, é administrado um barbitúrico (medicamento que reduz a actividade cerebral) para adormecer o doente. Quando isso não é suficiente para lhe pôr termo à vida, injecta-se um relaxante muscular que pára os batimentos cardíacos.
Tomás nunca teria sido abrangido pela nova lei (um bebé de um ano não tem capacidade para formular um pedido do género), mesmo assim, Vanda defende a emenda com convicção: “Claro que ninguém tem o direito de tirar a vida a uma criança, mas aqui é uma questão de dignidade. Todos os órgãos do Tomás entraram em falência, só o coração batia, isto é vida? Perguntava aos médicos se não havia mais nada a fazer e eles diziam que só podiam aliviar as dores.”
“Antes de se falar em eutanásia para menores, deveriam promover-se os cuidados paliativos pediátricos”, alerta Stéphan Clement de Clety, um dos três pediatras da Real Academia de Medicina da Bélgica que, apesar de não concordar com a nova lei, tem ajudado na sua estruturação. Na opinião do médico, esta mudança não passa de puro marketing político e de uma forma para poupar dinheiro: “Se és um político que se preocupa com crianças gravemente doentes, ficas bem visto perante a população. Além disso, sai muito mais caro estender e melhorar os cuidados paliativos do que legalizar a eutanásia. É mais fácil convenceres os teus pares a aceitar uma lei se esta tiver menos custos. Com isto, não digo que não deva existir, apenas que se deveria reflectir mais sobre o tema.”
Limite de idade
Holanda, Bélgica e Luxemburgo são os únicos sítios do mundo onde a eutanásia activa (praticada por um médico a pedido do doente) é legal. Na Holanda, através do Protocolo de Groningen, os médicos são ainda autorizados, mediante autorização dos pais, a pôr termo à vida de recém-nascidos (entre 1 e 28 dias de vida) que sofram de malformações e doenças graves. Foi também o primeiro país a estender a prática a menores, em 2002, mas, ao contrário da Bélgica, estabeleceu uma idade mínima de 12 anos. “Decidimos não sugerir um limite porque há crianças de 12 anos com menos maturidade do que outras de apenas oito. Uma coisa é certa: uma criança que passe por uma doença grave cresce muito mais depressa do que outra da mesma idade que seja saudável”, esclarece Clement de Clety.
Para o investigador da Universidade Livre de Bruxelas e membro do Grupo de Investigação de Cuidados de Fim de Vida, Kenneth Chambaere, a legalização da eutanásia em pessoas gravemente doentes é “necessária”. No entanto, é crítico da forma como a lei está redigida na Bélgica: “Permite diferentes interpretações e, às vezes, ultrapassam-se as fronteiras do razoável.”
Em 2012, a Bélgica registou 1432 eutanásias, cerca de 2% do total de mortes. Os gémeos Verbessem, 45 anos, que nasceram surdos e pediram para morrer quando souberam correr o risco de cegar (o que os impossibilitaria de comunicar um com o outro) e Nathan, um homem transexual de 44 anos que solicitou uma eutanásia depois de uma operação de mudança de sexo ter corrido mal, são dois dos casos que geraram mais polémica. O médico responsável pelas três eutanásias justificou a sua decisão com o “sofrimento psicológico insuportável” dos doentes. “Existem falhas no controle das práticas de fim de vida, mas também é verdade que são menos do que as que existiam antes de a lei ter sido aprovada. É preciso frisar que a eutanásia sempre foi praticada, só que de forma ilegal. Legalizar significa estabelecer regras e reduzir o vácuo ético em torno do tema”, defende Chambaere.
Cheiro das flores frescas
Um, dois meses. Izabela deverá morrer quando começarem a desabrochar as primeiras flores da Primavera. A mesma estação que Iwona Socewir, 38 anos, passou a ver com outros olhos desde que soube da doença incurável da filha. Depois disso, “mudou tudo”. “Há menos tempo mas também se corre menos. As pequenas coisas, como o cheiro das flores frescas ou o primeiro sol de Março, têm outro valor... Não é, minha querida?” Izabela cerra ligeiramente os olhos e sorri, um sorriso grande que lhe rasga o rosto. É a única resposta que pode dar. Não anda, não engole e há dois meses deixou de falar — com excepção para alguns sussurros que lhe saem em forma de gemido e só a mãe parece ser capaz de compreender. Acabou de fazer 18 anos. Há seis, diagnosticaram-lhe doença de Huntington — um problema neuromuscular degenerativo que afecta a coordenação motora e várias capacidades mentais. Nomes demasiado difíceis para uma adolescente compreender. 
A conversa é interrompida por uma mulher de bata branca com gestos precisos e mecânicos: levanta a camisola do fato de treino rosa-choque que Izabela traz vestido, deixa a nu o seu frágil esqueleto e injecta duas seringas — com comida e água — no tubinho de plástico que tem ligado ao estômago. Quando a filha tinha oito anos, começou a ter dificuldade em articular algumas palavras e Iwona desconfiou de que algo não estava bem. O médico acusou-a de procurar um problema que não existia. A mãe descansou. Mas chegou um momento em que foi impossível continuar a ignorar os sintomas: Izabela desmaiava quase todos os dias na escola e entrou em depressão.
Desde aí, têm sido anos de degradação — a degradação de um corpo que a mente não acompanha. “A minha filha está consciente. Todos os dias à noite a vejo sofrer, mas estou aqui para ajudá-la e fazer tudo o que for possível. Se um medicamento não está funcionar, procuramos outro. A eutanásia não é para mim. Não critico quem o faça, mas eu seria incapaz.” Um dia, Iwona explicou a Izabela o que era a eutanásia: “Significa que estás tão infeliz que já não queres ficar aqui. Que queres partir, ir ter com Deus. Mas, se partires, partes para sempre.  Achas que é bom ou mau?”, perguntou-lhe. “É mau”, recebeu como resposta. “Ela vai partir, como toda a gente. Toda a gente parte. Mas não é uma coisa desejada, nem por mim, nem por ela. Os problemas existem, mas também temos muitos momentos felizes”, relativiza Iwona.
Os dias na Villa Indigo
A extensão da lei a menores de idade, sugerida pelos deputados Philippe Mahoux (Partido Socialista), ex-cirurgião e um dos pais da lei de 2002, Christine Defraigne (Movimento Reformista), e Jean-Jacques De Gucht (Liberais e Democratas Flamengos) foi aprovada pela Câmara dos Representantes da Bélgica a 13 de Fevereiro (com 86 votos a favor das bancadas socialista, liberal e dos ecologistas, 44 contra dos democratas-cristãos e 12 abstenções). Quando a contagem foi conhecida, as pessoas que assistiam no Parlamento gritaram “assassinos”. “O tempo do doente não é o mesmo tempo daqueles que legislam. Está na hora de legislar (...) Pediatras e enfermeiros confrontados com as situações dramáticas de que os menores são vítimas pediram-nos, alguns imploraram, para permitir uma extensão da lei da eutanásia aos mais jovens”, declarou Philippe Mahoux, em Dezembro, quando o projecto de lei passou no Senado. Uma petição que apela ao Rei Filipe para não assinar o documento, considerado “um primeiro sinal para outros líderes europeus fazerem o mesmo”, começou a circular na Internet no dia seguinte. Mas a decisão já está tomada e o monarca não deverá ter nenhuma influência, sendo o seu aval um acto meramente protocolar.
Nos últimos meses, Izabela deixou de andar e falar. Vai começar a tomar morfina porque as dores são cada vez mais fortes. “Nestes casos, em que já não há nada a fazer, o principal objectivo é evitar o sofrimento do doente”, esclarece a pediatra da Villa Indigo, Vanessa Largent. Villa Indigo é uma das três casas de repouso belgas, uma espécie de hotel-hospital para crianças e adolescentes com doenças graves nos arredores de Bruxelas. Tem dez quartos, dois apartamentos com vista para o jardim (onde a família pode pernoitar), jacuzzi, um quarto com uma cama de água e música relaxante e uma sala de estar — para os miúdos fazerem trabalhos manuais, montarem puzzles e até cozinharem, quando ainda têm capacidade e vontade para isso. Os pacientes ficam ali em duas modalidades: até 32 noites por ano (5,34€ por noite) ou dois dias por semana (10 euros por dia).
Apesar de já ser maior de idade, Izabela continua a ir à Villa Indigo todas as terças e quartas-feiras porque não existe outra instituição pública que a possa acolher enquanto a mãe está a trabalhar. “É como se, de repente, deixasses de ser uma criança doente e te transformasses num adulto capaz. Já ninguém quer saber de ti”, atira Iwona. Fazer colagens é aquilo que mais diverte Izabela: “Ela aponta, escolhe o tipo de cabelo, as roupas e os sapatos e nós montamos as bonecas como pediu”, explica a enfermeira Anne-Catherine Dubois enquanto abre um livro para mostrar o trabalho daquele dia.
Quase tudo é cor-de-rosa, o mesmo tom do verniz com que Iwona lhe pinta as unhas todos os dias. “É a primeira coisa que a Iza me pede quando se levanta. Se pudesse, só se vestia de cor-de-rosa, é uma vaidosa a minha filha. Não passa dois dias seguidos com os mesmos brincos, as argolas grandes de missangas são as suas preferidas.”
Iwona nunca dramatiza, fala de tudo com uma leveza difícil de entender a quem vê de fora. Pouco a pouco, prepara-se para a morte da filha, como se isso fosse possível. “Já conversei muito com a Iwona, é um processo de mentalização para quando chegar o momento não ser um choque”, revela a enfermeira da Villa Indigo. “É verdade, mas prefiro não pensar nisso. Sei que pode estar perto, mas se não pensar na morte estou a empurrá-la para bem longe”, responde a mãe de Izabela.
Doença terminal e sofrimento insuportável
São muitas as vozes que se têm feito ouvir em conferências, debates e manifestações. De um lado, quem defende que a extensão da lei da eutanásia colocará os médicos numa situação ética delicada por considerarem ser impossível avaliar o grau de maturidade de uma criança; quem a acusa de não levar em conta a possibilidade de os pais não concordarem com o pedido do menor; e ainda há quem a considera uma “aberração”, uma medida “economicista”, “precipitada” e “dispensável”; um “primeiro passo muito perigoso” para que no futuro crianças com deficiências e distúrbios genéticos, como a Trissomia 21, também possam fazer pedidos de eutanásia. Do outro, os que garantem que privar os menores deste direito é menosprezar o seu sofrimento face ao dos adultos, que legalizar a prática é imprescindível para que a eutanásia deixe de ser feita às escondidas e sem regras e que este projecto de lei é fruto de uma necessidade denunciada por muitos profissionais, a trabalhar no terreno, durante a comissão de avaliação (que durou quase um ano e era composta por juristas, médicos e membros da sociedade civil). 
No jornal La Libre Belgique, a presidente da Comissão Ética da Associação Belga dos Praticantes da Arte de Enfermagem defendeu que a doença terminal de uma criança já é por si uma “situação terrivelmente difícil” para “ainda se estarem a criar dúvidas éticas”. Catherine Stryckmans levanta uma série de questões: “O que vai acontecer quando os pais não estiverem de acordo um com o outro apenas pelo prazer de se contrariarem? (...) E qual será o impacto para um irmão ou uma irmã de saber que o pai e a mãe estão de acordo em matar mais rapidamente — porque afinal é disso que se trata — um filho?”
Philippe Mahoux diz que a legislação não pretende definir a concepção de morte — “isso é para os teólogos e filósofos” —, mas “permitir aos mais novos, com o consentimento dos seus pais, escolher como querem morrer quando confrontados com uma doença terminal e um sofrimento insuportável”, explica o deputado do Partido Socialista numa das suas muitas declarações públicas.
Em Outubro, numa sondagem La Libre Belgique / Rádio Televisão Belga Francófona, 38% da população revelou-se “completamente a favor” da nova lei, 36% “bastante a favor” e apenas 6% “completamente contra”. O pediatra Clement de Clety justifica estes números com uma falta de clarificação dos termos. “Como é óbvio, as pessoas acham normal que as crianças não tenham de sofrer antes de morrer. Se falamos de eutanásia, temos de garantir que nos referimos exclusivamente ao pedido para morrer feito pelo paciente. Às vezes, encontram-se artigos que falam de crianças entre um e 15 anos, peço desculpa, mas é impossível uma criança de três anos pedir uma eutanásia”, critica. Termos como “ortotanásia” (limitação ou suspensão da terapêutica) e “suicídio assistido” (auxiliar um doente a praticar o acto que conduzirá à sua morte) são muitas vezes confundidos com o de “eutanásia activa”.
Um menor não pede para morrer
Para a professora da Universidade do Minho, Laura Ferreira dos Santos, que estuda há vários anos questões relacionadas com a eutanásia, o que está a ser discutido é um direito fundamental que não pode estar sujeito ao poder das maiorias. “Os países do Benelux [Bélgica, Holanda e Luxemburgo] têm uma intervenção cidadã muito superior à nossa e também são muito menos influenciados pela religião. Em Portugal, nem sequer há uma associação ‘right to die [direito a morrer]’, o que já acontece em Espanha, França ou Itália. Mas o problema existe e já levou duas portuguesas a morrer na Dignitas [associação suíça que ajuda doentes terminais a morrer através do suicídio assistido].” Com uma opinião contrária, o presidente do Conselho Nacional de Ética não reconhece uma urgência em debater este assunto: “A minha sensibilidade é que a esmagadora maioria da população portuguesa não se revê nessa necessidade”, justificou à Rádio Renascença na semana passada Miguel Oliveira da Silva. 
Um menor que peça para morrer, mesmo que gravemente doente, é uma situação muito rara — nisso, médicos e enfermeiros estão de acordo. Na Holanda, desde 2002, registaram-se apenas cinco casos, um deles num adolescente de 12 anos. “Está a criar-se uma lei para situações que não existem”, alerta a fundadora da Unidade de Cuidados Paliativos Pediátricos na região francesa da Bélgica e enfermeira do Hospital Universitário de Saint-Luc, em Bruxelas.
Sonja Develter já acompanhou mais de 200 crianças em fim de vida e garante que, em 22 anos de serviço, nunca um menor lhe pediu para morrer: “O que eles dizem é que estão fartos, estão fartos daquela situação, não necessariamente da vida.”
Os pais, desesperados, sim, já o fizeram muitas vezes. “Mas depois, de um dia para o outro, mudam de opinião. Quando chega a altura de aumentarmos a dose de morfina que vai tornar o doente sonolento, também são os primeiros a pedir para não o fazermos. Os nossos cuidados paliativos pediátricos funcionam muito bem: temos uma equipa de enfermeiros, com um telemóvel e um carro-farmácia, disponível 24 horas por dia. Se o doente estiver em casa e os pais não se sentirem confortáveis, dormimos lá; e quando o processo de morte se inicia, nunca saímos de perto. A administração de morfina, que vai aumentando de acordo com o desconforto, garante que a criança parta sem dor”, explica.
"Não quero partir como um peixe fora de água"
Vanda encontrou na equipa de cuidados paliativos do Hospital de Saint-Luc uma segunda família. Com eles, chorou, desabafou medos, falou abertamente da morte. “Depois de o Tomás partir, telefonaram-me várias vezes para saber como estava. Incansáveis, fenomenais, não podem deixar de existir”, descreve. Garantiram-lhe sempre que o filho não estava a sofrer, que as doses de morfina eram suficientes para que não sentisse dor. No entanto, houve um momento em que deixou de acreditar no que lhe diziam: “Era impossível não existir dor, eu tocava no Tomás e ele encolhia-se todo. Não sou parva, é claro que lhe doía. A maior aflição foi vê-lo, na fase final, com dificuldade em respirar. O meu filho morreu de uma forma que sempre me disseram que não iria acontecer.”
A morte por asfixia é uma das mais difíceis porque os medicamentos não atenuam as dificuldades de respiração. A única forma de aliviar este sintoma é aplicar uma sobredosagem que adormecerá o paciente para sempre — aquilo a que se chama “sedação paliativa terminal”. “Sabe-se à partida que a pessoa vai morrer (morreria de qualquer maneira, assim só se evita o prolongamento da dor). Não é considerada eutanásia porque o objectivo não é causar a morte, mas acabar com a dor, embora seja uma distinção muito difícil de fazer mesmo para os médicos”, esclarece Laura Ferreira dos Santos.
"Não quero partir como um peixe fora de água”. Foi a única coisa que Anne (nome fictício) pediu quando lhe disseram que provavelmente iria passar pelas mesmas dificuldades respiratórias dos meninos que viu morrer ao seu lado, no quarto do hospital onde ficou depois de ser operada. “Percebo que estejas assustada mas nós vamos estar lá, não deixaremos que sofras”, garantiu-lhe o pediatra. Morreu a 20 de Janeiro, o mesmo dia em que nascera 14 anos antes. Pediu ao pai para a levar para o hospital — nunca quis morrer em casa — e que chamasse toda a família para se despedir. Quando o fez, cobrou ao médico aquilo que lhe prometera.
Acabar com a fase de "quase-morte"
“Penso que quando existem bons cuidados paliativos não precisamos da lei. Tudo é feito com humanidade, são usadas todas as possibilidades para controlar a dor”, defende Sonja Develter. Kenneth Chambaere, do Grupo de Investigação de Cuidados de Fim de Vida, diz que a posição da enfermeira é “ingénua” e “irrealista”: “É verdade que alguns doentes adultos (entre 15 a 20%) desistiram do pedido de eutanásia devido aos bons cuidados paliativos, mas não é uma regra.”
Há quem defenda que um dos problemas desta lei é poder acabar com a fase de “quase-morte” em que as pessoas dizem viver “experiências tranquilizadoras”, que as ajudam a “partir em paz”. “Os políticos desconhecem este período. Quase todas as crianças que vão morrer têm a possibilidade de se sentir sair fora do corpo, experimentar outro nível onde se sentem felizes. Sei porque lido com elas todos os dias. Mas quando se fala nisso é como se fôssemos malucos, como se aquilo que não se pode explicar simplesmente não exista”, queixa-se Sonja Develter.
A enfermeira conta já ter tido três doentes que anteciparam o dia em que iriam morrer. Uma vez, enquanto fazia a visita diária a casa de David (nome fictício), Sonja sentou-se na cozinha a tomar uma chávena de café com a mãe, uma psicóloga. O menino insistia em fazer um círculo em torno do número cinco e a mãe advertia-o: “Não filho, o teu aniversário é só no outro mês.” Passado algum tempo, Sonja recebeu um telefonema: “Lembra-se de o David ter assinalado aquela data no calendário? Foi o dia em que ele morreu.” “Cada vez acredito mais em algo universal, tive pacientes judeus, muçulmanos, católicos, agnósticos e todos têm os mesmos medos, todos falam na luz”, relata.
Para a professora da Universidade do Minho, nenhum desses motivos é suficiente para travar a lei da eutanásia, porque “as pessoas que narram essas experiências não morreram de facto, por isso é que falam delas”. “Estiveram algumas delas em morte clínica? Talvez, mas ‘regressaram’. Quem morreu nunca voltou para dizer como foi. Quando nem sequer a universalidade destas ocorrências está provada entre as pessoas que ficaram entre a vida e a morte, como dizer que é uma fase necessária? É uma posição irrazoável e ilógica. Mesmo que fosse provada a sua existência. E, perante o sofrimento, as pessoas podiam querer prescindir dela”, contrapõe Laura Ferreira dos Santos. 
"O meu filho morreu no nosso ninho"
Depois de pedir a Elsie para não ficar triste porque em breve teria uma menina para o substituir, Rafael, nove anos, partiu em três a hóstia que o padre lhe deu — para si, para a mãe e para a enfermeira Sonja. Na sala, começou a rezar o Pai Nosso em espanhol. Cada vez mais azul, cada vez com mais dificuldade em respirar, insistia em dizer toda a oração em voz alta. No final, sentou-se no sofá, enrolou-se nos braços da mãe e morreu. Há 18 anos, Elsie não sabia que haveria de recordar o momento como “um dos mais bonitos” da sua vida.
Na Bélgica, um menor que esteja a ser acompanhado pelos cuidados paliativos pode escolher morrer em três sítios: no hospital, em casa, ou num dos centros de repouso para crianças. Sempre assistido por um enfermeiro ou médico da equipa. “O meu filho morreu no nosso ninho, nos meus braços, ao pé dos seus brinquedos; nem se pode comparar este conforto com a frieza de um hospital. O momento é de uma dor monstruosa, mas a forma como tudo está organizado ajuda”, conta Elsie Medina, 40 anos, dominicana a viver na Bélgica há quase três décadas.
A realidade portuguesa é muito diferente. A primeira unidade de cuidados paliativos pediátricos começou a ser construída em Novembro de 2013, em São Mamede de Infesta, Matosinhos. Será também a primeira da Península Ibérica. “Em Portugal, os cuidados paliativos funcionam muito mal, para menores e adultos. Morre-se mal aqui. As crianças morrem nas instituições de saúde onde estão internadas ou em casa. Tudo dependerá da sorte que tiverem. E é isso que está mal: ser obrigado a depender da sorte para ter uma morte menos má, seja-se adulto ou menor”, critica Laura Ferreira dos Santos.
A morte de um filho é uma cicatriz que nunca se apaga. Mas a ferida fecha, muito devagar, com o tempo. “Agora, há dias em que acordo e a primeira coisa em que penso já não é ‘o meu filho morreu’”, conta Elsie.
Nas famílias que a Revista 2 contactou, só as mães quiseram falar. Para os homens, parece ser mais difícil verbalizar o que sentem. Fecham-se, preferem não partilhar a mágoa. Vanda lembra-se de ir na auto-estrada e desejar enfiar-se debaixo de um carro para ir ter com Tomás. Diz que se não fosse o marido Miguel hoje não estaria viva. A seguir, foi a vez de Miguel fazer o luto: no último ano, entregou-se ao álcool e rejeitou acompanhamento psicológico. Elsie divorciou-se meses depois de Rafael morrer. O pai do menino entrou em depressão e nunca mais voltou a Bruxelas, nem para o seu funeral.
A psiquiatra suíça Elizabeth Kübler-Ross teorizou no livro On Death and Dying sobre as fases de luto por que passam as pessoas que têm de lidar com a perda. Distinguiu cinco momentos distintos: a negação, onde se rejeita a existência do problema; a raiva, marcada pela revolta e ressentimento; a negociação, fase em que se tenta fazer um acordo para retomar a normalidade — dentro de si próprio ou com o apoio da religião; a depressão, onde só existe tristeza, medo e desesperança; e a aceitação, momento em que começa a existir uma consciência das possibilidades e limitações.
No último mês de vida, Rafael concretizou os seus sonhos possíveis. Elsie vendeu o pequeno apartamento que tinha em Bruxelas para poderem “fazer tudo o que [o filho] quisesse”. Iam todos os dias ao restaurante comer bife com batatas fritas e beber Coca-Cola. Ainda que depois a comida custasse a passar na garganta. Foram três vezes à EuroDisney e compraram dezenas de jogos para a Sega, a consola da moda na altura. “É por isso que sou contra a eutanásia. O meu filho nunca me disse que queria morrer e fomos tão felizes naquele mês de Dezembro. Vivemos coisas juntos que nunca irei esquecer”, justifica. Só dois anos mais tarde, viria a perceber o que Rafael lhe quis dizer quando pediu para que não ficasse triste porque uma menina iria substituí-lo: estava grávida de Hermina, hoje com 15 anos.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

No próximo ano em Beja... (Crise promove curso intensivo para ser prostituta)


Face ao aumento do número de mulheres interessadas em dedicar-se à prostituição, foi criado um curso de "profissionalização".

Para fazer face ao desemprego, são cada vez mais as mulheres espanholas interessadas em fazer parte do mundo da prostituição.
Foi em resposta a este facto que a associação de trabalhadoras sexuais, Aprosex, decidiu proporcionar, às mulheres interessadas, um curso intensivo de "profissionalização" na área.
O objetivo da iniciativa pretende ajudar as mulheres a superar todas as dificuldades iniciais. Sejam elas relacionadas com a sexualidade, saúde ou finanças. Durante a formação, as mulheres vão aprender a refletir sobre a necessidade de tratar bem os clientes ou não mentir nos anúncios sobre a sua fisionomia.
Conxa Borrel, presidente da Aprosex, confirmou ao diário espanhol 'El Periodico' que são, na maioria, mulheres jovens, entre os 18 e os 23 anos, aquelas que têm optado pela prostituição, sobretudo ao não encontrarem saída profissional ou outra forma de pagar as despesas da universidade. A somar a esta faixa etária, mulheres desempregadas com mais de 50 anos recorrem também à prostituição.
O curso intensivo tem o nome "Prostituição: noções básicas para a profissionalização" e contará com o apoio de uma psicóloga clínica.
A inicativa justifica-se pelo facto de "ser prostituta não ser algo vocacional. Contudo, quando se toma essa decisão, é necessário saber umas quantas coisas para que não se sintam perdidas, como aconteceu comigo no início", explicou Conxa Borrell, presidente da associação e prostituta de luxo. O curso realiza-se no próximo sábado, em Barcelona.

Uma história de violência doméstica

Para acompanhar aqui!

Jogo alcoólico bizarro faz mais uma vítima mortal


Um jovem de 20 anos morreu quatro dias depois de se filmar a si mesmo a beber dois litros de Gin, num desafio do jogo Neknominate para publicar o vídeo no Facebook.


O jogo bizarro que envolve uma grande dose de loucura e enormes doses de álcool, o Neknominate, já fez pelo menos cinco vítimas mortais na Grã-Bretanha.
Bradley Eames, de 20 anos, misturou dois litros de Gin com saquinhos de chá, e antes de começar o desafio publicou uma fotografia nas redes sociais com a legenda: "É assim que se bebe."

Rapidamente amigos e familiares – incluindo a mãe – alertaram Bradley Eames para os perigos do jogo. A amiga Chantelle Fearn escreveu-lhe: “Já morreram pessoas a fazer isso, não voltes a repetir.” O jovem atleta garantiu que não voltaria fazê-lo, mas que queria “mostrar quem é o maior.”
Estima-se que tenha bebido quase 30 doses de gin, durante a realização do vídeo de dois minutos, antes de desafiar os seus amigos a superá-lo.
Momentos depois de fazer o upload do vídeo, Bradley queixou-se que se sentia doente. De acordo com o amigo que tenha visto o filme, ele escreveu: "doí-me a barriga". Quatro dias depois acabaria por morrer. Bradley Eames foi encontrado morto na sua casa, em Nottingham.
A polícia confirmou ter conhecimento do vídeo, mas que a causa de morte ainda não é clara. Um porta-voz da Polícia de Nottinghamshire revelou que "O exame post-mortem não foi conclusivo, serão necessários mais testes para estabelecer as causas da morte”.
Mas a família e os amigos do jovem não têm dúvidas. No dia da sua morte, a madrasta, Wendy Phelps-Eames, partilhou uma reportagem sobre outro caso de morte associada ao Neknominate, com a legenda “vocês precisam de acabar com isto agora”.
Esta é já a quinta morte associada a este jogo viral que consiste em fazer filmes enquanto se bebe grandes quantidades de álcool, publicar os vídeos no Facebook e desafiar os outros a superá-los.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Mulheres sem útero lutam pelo direito a barrigas de aluguer


Mulheres sem útero, que só serão mães através da maternidade de substituição, criticam a lentidão da discussão dos projectos-lei que permitem o recurso a esta prática e prometem lutar por esta solução "medicamente possível", mas "legalmente impossível".Joana, de 27 anos, e Maria, de 28 anos, são duas das várias mulheres em Portugal que, sem útero, não podem gerar um filho, neste caso por serem portadoras de uma anomalia congénita: a Síndrome Mayer Rokitansky Kuster Hauser (MRKH).
"A única hipótese de ter um filho biológico é recorrer à gestação de substituição", disse Joana à Lusa.
Para Maria, "ser mulher traz esta vontade enorme de termos filhos". "Eu, como qualquer mulher que tem este desejo, anseio por um filho biologicamente meu e do meu companheiro, a extensão do nosso amor. Claro que sei que existem outras possibilidades, e que 'parir é dor e criar é amor', mas gostaria de esgotar esta possibilidade, uma vez que tenho material genético em perfeitas condições para o conseguir".
O que pretendem é usar o seu material biológico (óvulos), fertilizado por espermatozóides dos companheiros, num embrião implantado no corpo de uma mulher que irá gerar o feto, não sem antes terem a garantia legal de que será reconhecida como mãe a portadora do material genético e não a que suporta a gravidez.
Há dois anos, quando os projectos do PS e do PSD, que permitem o recurso à gestação de substituição em caso de infertilidade, foram aprovados no Parlamento, Joana e Maria acreditaram estar mais próximas de concretizar o seu sonho.
Mas os projectos baixaram para discussão na especialidade e o passar do tempo aumentou as suas angústias, conscientes que estão dos efeitos do tempo na sua fertilidade.
"Olho para todo este processo com tristeza, pois sei que é medicamente possível e legalmente impossível. Vivo num país, onde regularmente são lançadas notícias sobre o envelhecimento da população e eu, que tenho esta vontade enorme de ser mãe, sinto-me triste com o Parlamento, por não conseguir chegar a um consenso sobre este assunto, tão delicado para mulheres como nós, pois a solução existe", sublinha Maria.
Foi precisamente esta demora na discussão que levou Joana e Maria a arregaçar as mangas, questionando quem acreditam ter responsabilidades nesta matéria.
Falaram com a presidente da Comissão Parlamentar de Saúde, Antónia Almeida Santos, a quem contaram a sua história. À Lusa, a deputada socialista confirmou o encontro e, apesar de não se pronunciar sobre casos concretos, adiantou que o prazo de vigência do grupo que está a analisar os diplomas, e a ouvir especialistas, foi recentemente prorrogado.
Joana espera que os deputados sejam sensíveis aos argumentos destas mulheres e lembra que "a sociedade portuguesa já aceitou outros temas também delicados".
No rol de contactos que estão a organizar, Joana e Maria escreveram aos grupos parlamentares - tendo um encontro com o Bloco de Esquerda na quinta-feira - à presidente da Assembleia da República e ao ministro da Saúde.
"Reconhecemos a complexidade de legislar sobre a matéria, mas compete-nos dar voz a situações reais, de jovens casais que têm a legítima expectativa de ver reconhecido o direito às possibilidades que a ciência e a medicina dispõem para tratamento desta situação particular de infertilidade", lê-se numa das missivas enviadas, a solicitar audiência.
Aos que se opõem à gestação de um filho no útero de outra mulher, Joana garante: "Ser mãe é um processo, é muito mais que gerar uma criança. É uma mudança grande na vida de uma mulher. No meu caso falta-me o processo inicial, a gestação".
Joana e Maria também já foram recebidas pelo presidente do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA), o juiz Eurico Reis, para quem estes casos inscrevem-se "perfeitamente" nos requisitos e objectivos das normas que este organismo sugeriu ao parlamento para introdução no texto da lei que regula a PMA.
Lusa/SOL

Australiana decide prosseguir gravidez apesar de bebé nascer com duas cabeças


Australiana decide prosseguir gravidez apesar de bebé nascer com duas cabeças

Um casal asutraliano decidiu prosseguir com a gravidez apesar de uma ecografia ter revelado que o bebé vai nascer com duas cabeças.

Ao analisar a ecografia, os médicos foram surpreendidos ao verificar que o bebé tem duas caras e dois cérebros ligados a um único tronco cerebral. Do pescoço para baixo, o bebé é normal: tendo todos os órgãos vitais, duas pernas e dois braços.
Os médicos tentaram dissuadir os pais a terem a criança, argumentando que esta seria discriminada e que as probabilidades de morrer no parto ou nos primeiros anos de vida seriam elevadíssimas.
Ainda assim, Renne Young e Simon Howie decidiram que querem ter o bebé.
O casal, que tem sete filhos, invoca «razões morais» para recusar um aborto e compara a situação com outros problemas. «É o mesmo que ter uma criança autista ou com Trissomia 21. Eu sou contra terminar uma gravidez se o bebé é saudável», disse o pai.
Segundo os médicos, cada cara do bebé terá dois olhos, um nariz e uma boca.
Como o bebé tem dois cérebros, os pais consideram que se tratam de duas crianças, mas pensam dar-lhe apenas um nome.
O mais recente caso semelhante, uma menina indiana chamada Lali, morreu aos dois meses de idade.

Quando a tradição é um crime

Eu me ergo!
Pela menina que fui um dia,
Pela infância interrompida (.) por um amanhã em que o Fanado deixe de ser o nosso fado'
Poema de Rita Ié, lido na cerimónia do Dia da Mulher Guineense,
na Casa da Achada, Mouraria, a 30 de janeiro
A voz a estas mulheres. Oiça-se Aissatu Camará, a lembrar-se do dia em que a tia pedira, e a mãe deixara, que a levassem para a barraca, na mata, onde enfiam as meninas que vão ao sacrifício, ao fanado. "Só me disse para não fugir e que, se tentasse, podia morrer." Tinha uns seis ou sete anos. Ficou naquela mata durante três meses, a dormir no chão e à chuva. Era tempo de férias, no verão tropical sempre cheio de intempéries. Quando chegou a sua hora, obrigaram-na a ir para a barraca. Aissatu conta que chorava com todas as suas forças. "Fiquei sem voz." Não lhe valeu de muito. Pouco tempo depois, a mãe imigrava, deixando-a ao cuidado dessa tia, em Bissau, até ao início da adolescência.
Com as mãos trémulas, e a garganta embargada, não esconde que a invade uma série de sentimentos contraditórios. "A minha tia só me mandou para aquilo por causa da festa." Ainda tentou desculpar a mãe. Mas, na verdade, nem o tempo que passou Aissatu tem hoje 27 anos, a mãe 47, a tia 54 apaziguou a mágoa entre as mulheres da família.
"Continuam a defender que é bom, para se ficar pura", desespera a jovem, que só há pouco tempo confessou o seu drama às melhores amigas. "Porque se não se fala, nunca mais acaba." É uma realidade profundamente enraizada no mundo africano, que ultrapassou fronteiras, galgou continentes e hoje se cruza connosco, na rua apesar de, desde 1979, a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Tortura contra as Mulheres ter sido ratificada por 185 países. No globo, o drama atinge proporções gigantescas: em 2010, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estimava que já tivesse vitimado mais de 100 milhões de meninas, em 28 países (entre estes, a Guiné-Bissau). Mas, segundo a mesma OMS, Portugal e o resto da Europa são atualmente países de risco, com a prática a reinstalar-se devagarinho, devido aos fluxos migratórios.
Sabemos que a sexta maior comunidade de estrangeiros em Portugal é a da Guiné. Segundo o Censo de 2011, há 7,2 mil milhões de mulheres guineenses. Não se sabe quantas sofrem escondidas: decorre, até ao final do ano, um estudo para conhecer a prevalência do fenómeno, coordenado pela Comissão pela Igualdade de Género. Mas, segundo o retrato que se segue, entre a comunidade feminina que veio da Guiné, uma grande maioria será vítima de uma prática cercada de silêncios e vivida em segredo. Fanado, s.m., apertado, muito justo. Mas também amputado, mutilado. Ritual de iniciação na Guiné Bissau, frequente tanto nos bairros da periferia dos centros urbanos como nas aldeias. É executado sempre em terreno sagrado, com a aceitação da divindade.
Ali, uma mãe africana não é uma malfeitora, manda as filhas para a festa porque é um costume. Na comunidade, todas as mulheres são excisadas.
Em questão, diz a definição da OMS, estão todas as intervenções que envolvem a remoção, parcial ou total, dos órgãos genitais femininos externos ou neles provoquem lesões, por razões não médicas. Procede-se ao corte total ou parcial do clítoris e do seu capuz, a raspagens, perfurações, cortes. É realizada por fanatecas, as excisadoras, de alto estatuto na comunidade. Os alvos são raparigas entre os 4 e os 12 anos mas podem ser meninas mais novas. Sejam pedaços de vidro, sejam canivetes, lâminas de barbear, tesouras ou navalhas, tudo serve para cortar. A esterilização dos materiais não faz parte da intervenção, a anestesia não é uma prática corrente. A excisão é socialmente compreendida como um ritual de passagem à idade adulta, que permite a integração social da menina e fortalece a coesão do grupo a que pertence.
Isso vê-se na festa, a celebração que se segue, e nas oferendas, em bens ou dinheiro.
A excisão tem também, como objetivo, o controlo da sexualidade da mulher. Em sociedades onde o prazer feminino não é permitido e a virgindade é valorizada, a cicatrização pós-excisão, fechando o acesso ao canal vaginal, acaba por funcionar como um "selo de garantia" extra para os homens. É também o único tipo de violência de género feita pelos familiares, convictos de que assim, mais tarde, as meninas não serão ostracizadas. Estão convictos de que é um ato de amor. Independentemente das hemorragias, das infeções e, tantas vezes, da morte...
Autoconsciência
Apostado em mudar este mundo, um grupo de jovens ganha força em vários países europeus: Reino Unido, Irlanda, Holanda e Portugual.
"Queremos ser agentes da mudança", assume Diana Lopes, 28 anos, coordenadora, na Associação para o Planeamento da Família, de projetos para esta área. "Queremos dar ferramentas às mulheres para que o fanado não se torne uma desculpa para conquistar poder na comunidade ou para sobreviver." A história de Cadidjatu Baldé, 28 anos, já reflete uma mudança. Há três anos em Portugal, não esquece o grande marco da sua infância.
Foi uma avó que a excisou. Quando o assunto se tornou tema nacional, há pouco mais de uma década, o pai chamou-a a ela e às irmãs e pediu-lhes desculpa. "Disse que não sabia bem como era, que, se soubesse, nunca teria aceitado." Agora, na sua família, mais ninguém será excisado as sobrinhas, pequeninas, já foram poupadas. "Mas a mentalidade de muita gente ainda não mudou..." Neste ativismo crescente, uma das vozes mais destacadas é a de Filomena Djassi, que já cresceu em Portugal mas nem por isso escapou à tradição: vem de uma família em que corre o sangue dos fulas e dos mandingas, etnias adeptas do fanado, com a ideia de proteger os filhos e garantir a sua sobrevivência.
A fazer um doutoramento, Filomena não quer falar de dramas, mas do caminho de saída, do apoio às mulheres encaminhandoas para a escola. Para isso, criou a Musqueba, movimento que visa a educação e valorização de mulheres africanas nos contextos onde se inserem. "Temos de lhes dar o poder de comandarem a sua vida, de assumirem a responsabilidade do seu sustento." Esse é um ponto muitas vezes esquecido: "Passar por uma excisão tem consequências físicas e psicológicas mas também sociais." É por isso, defende, que há mulheres a trabalhar nas Nações Unidas que são oficialmente contra a prática mas cujas filhas são mutiladas. Filomena não desarma: "Não podemos ficar indiferentes a este holocausto silencioso." O primeiro programa português contra a mutilação genital foi lançado há cinco anos.
Em fevereiro passado, um outro rosto entrou na campanha. É o de uma rapariga que segura um cartão em que se lê: "Muda®". Chama-se Yasmin Sissé e tem 20 anos. Há 12 que não vai à Guiné. Na família, o fanado era normal. Ela prefere falar do assunto na terceira pessoa.
Mas não hesitou em dar a cara: "Sou contra, como sou contra cortar o dedo a uma pessoa.
É algo que faz parte do nosso corpo." Tal como Filó, Yasmin sabe que a tradição não tem nada de religioso: "Há pessoas que inventam muitas coisas, são como os terroristas dizem que é tudo em nome de Deus, mas não está no Corão." Ambas também sabem que, para muitas mulheres, ir contra a tradição significa rejeição.
Peças-chave
"E como vivemos, se formos rejeitadas?" O repto é lançado por Anabela Rodrigues, do grupo do Teatro do Oprimido, na festa da Casa da Achada, no Dia da Mulher Guineense.
A peça chama-se Assim, quem vos vai querer? Da plateia, Adiato responde prontamente: "Fazemos uma sociedade de rejeitadas " e é chamada ao palco. Primeiro, veste a camisola, uma t-shirt branca com a frase Muda® a Realidade da Excisão. Depois, atira: "Sou uma mulher livre, faço o que quiser com o meu corpo." Adiato Baldé, 24 anos, vice-presidente da Associação de Estudantes da Guiné-Bissau em Lisboa, é filha da presidente do Comité para o Abandono de Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança, na Guiné-Bissau. Está muito atenta à comunidade residente em Portugal: "Muitas meninas vão de férias e, no regresso, acabam no médico, porque estão com infeções." Em 2009, Portugal assumiu, formalmente, um compromisso relativamente à eliminação da excisão, inscrito no Plano Nacional para a Igualdade Cidadania e Género. Esses votos são renovados hoje, 6, Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina.
Tanto na ação de prevenção prevista para a Escola Secundária da Baixa da Banheira, na área do projeto Informar para a Sensibilização e Intervenção (ISI) contra a Violência de Género, promovido pela associação Uma, como na cerimónia no Hospital Amadora-Sintra para alertar os profissionais de saúde.
A estas iniciativas, junta-se a campanha Pelo fim da Mutilação Genital Feminina, conduzida pela Amnistia Internacional a partir de Bruxelas, como pressão sobre as instituições europeias para providenciarem proteção às mulheres e crianças que fogem dos seus países, com medo de serem mutiladas.
Para já, sabemos que os homens são peça-chave: se o fanado deixar de ser pré-requisito para o casamento, tende a desaparecer.
Ussumane Mandjam, 33 anos, já decidiu: "As minhas filhas não serão excisadas." Foi essa postura que fez a diferença, em casa de Fatumata Djaló, 54 anos, há 23 a viver na linha de Sintra, em tempos uma defensora da prática.
Quis excisar a filha, o marido não deixou.
Hoje sabe que "não há razão para cortar".
É verdade que tanto cá como na Guiné, onde o Parlamento assinou uma lei específica em 2011, a prática é crime. É punida com penas dos oito aos dez anos de prisão. Mas quem está na luta insiste que só a lei é insuficiente: 80% da população guineense é analfabeta e sente as campanhas como um ataque às suas convicções mais profundas. Fica o alerta de Miguel Areosa Feio, da Associação para o Planeamento da Família: "Passou a ser feito com crianças muito pequeninas, bebés, e de uma forma ainda mais escondida."

Um asterisco em vez do nome do pai



Desde os 12 anos que Cristina Nunes sabe que quer ser mãe. O tempo foi passando e tinha definida na sua cabeça uma data limite para tomar a decisão, os 33 anos. Como quando chegou à idade não tinha parceira decidiu avançar sozinha. Fez a primeira consulta em Portugal mas decidiu que todo o resto do processo decorreria em Espanha, em Vigo, porque era a poucas horas de carro do Porto, cidade onde tinha onde ficar, teve que lá ir seis vezes. Engravidou aos 33 anos, Ana nasceu quando tinha Cristina 34 anos.
Fez o registo da bebé na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, onde a filha nasceu, mostrando uma declaração da clínica espanhola a dizer que tinha recorrido a um dador e que a lei espanhola não permitia a sua identificação. Foi aberto um processo de averiguação da paternidade, como sempre acontece. Lembra-se de ainda ter sido chamada ao Tribunal de Família e Menores de Lisboa mas “estava tão feliz com a minha filha” que isso nem sequer a incomodou. Recebeu a decisão pelo correio, o processo não tinha tido continuidade “por ser não possível apurar a paternidade”.

Os pais de Cristina, que é programadora informática e vive em Lisboa, aceitaram a sua orientação sexual mas foi diferente quando lhes contou, facto consumado, que iam ter um neto fruto de uma inseminação artificial com dador anónimo. A única coisa que sabe dele é que os seus traços físicos se assemelham aos de Cristina, em tom de pele, cabelo, olhos. O pai aceitou a inevitabilidade da decisão, “não há nada a fazer”, a mãe deixou de lhe falar durante toda a gravidez, até aos quatro meses se ter apaixonado pela neta.

Ana vai fazer três anos, ainda não começou a fazer perguntas, mas estarão para breve, “pelo que eu li é a partir dos três, quatro anos que começam a perceber as estruturas familiares”. Cristina já tem algumas respostas preparadas. “Ela vai saber desde sempre”. Primeiro a explicação vai ser muito simples, “a mãe queria ter um bebé e foi ao médico. À medida que for crescendo vou-lhe explicando melhor.”

Fez o cartão de cidadão de Ana. Antes do nome da mãe, onde tradicionalmente está o do pai, os serviços de identificação civil puseram um asterisco. “É uma questão informática, não podem ter um vazio. É melhor do que ter lá escrito desconhecido”. Cristina às vezes tem receio de que a filha sinta falta de uma figura paternal. “Nunca vai ter pai”, mas depois pensa que “tem outras figuras que a vão ajudar nessa ausência.”

Inspecção da Saúde investiga clínica suspeita de ter feito inseminação artificial em mulher solteira


Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida esclarece que a unidade localizada na capital fez apenas tratamentos auxiliares e que a inseminação foi feita em Espanha, logo, não há ilícito. Mais de 100 mulheres vão todos os anos ao estrangeiro para engravidar.
Mais de 100 mulheres vão todos os anos ao estrangeiro para engravidar Fernando Veludo/NFactos
O processo repete-se nas conservatórias de registo civil. Sempre que uma mulher solteira vai registar o filho e diz que não sabe quem é o pai, por ter engravidado recorrendo a um dador anónimo, o facto é comunicado ao Ministério Público que abre o chamado processo de averiguação oficiosa da paternidade. Só que desta vez o tribunal de família e menores remeteu também o caso para a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) para investigar o envolvimento de uma clínica em Lisboa no processo de inseminação artificial de uma mulher sem parceiro, prática que é proibida em Portugal. O Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida respondeu em parecer do mês passado que não houve ilícito uma vez só alguns actos médicos foram realizados em Portugal.
A lei portuguesa apenas permite o recurso a técnicas de procriação medicamente assistida a casais heterossexuais, casados ou em união de facto há pelo menos dois anos, desde que sofram de problemas de fertilidade. Não permite o uso destas técnicas quando não há razões de saúde. Mas esse não é o caso de, por exemplo, Espanha, Reino Unido, Bélgica, Dinamarca. A maioria das mulheres sem parceiro rumam ao país vizinho para fugir à proibição portuguesa.
Foi o que fez a mulher deste caso, embora tenha sido seguida clinicamente durante todo o processo em Portugal. Quando foi registar o filho à conservatória, a ausência do nome do pai foi comunicada ao Ministério Público que abriu o processo de averiguação oficiosa da paternidade. Em Portugal, é proibido haver filhos de pais ou mães desconhecidas mas, nos casos de gravidezes que tiveram a origem em dadores anónimos, o destino do processo costuma ser o arquivamento.
Só que desta vez o Tribunal de Família e Menores onde correu o processo decidiu também remeter uma certidão do caso à IGAS para que investigasse o envolvimento da clínica, localizada em Lisboa, no processo de inseminação artificial, no sentido de saber se a sua conduta podia ser considerada ilícita. A IGAs pediu então um parecer ao Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) que deliberou que, neste caso, não foi praticado qualquer ilícito em território português.
“Não obstante os actos médicos praticados terem objectivamente servido de apoio à concretização de tratamentos de Procriação Medicamente Assistida (PMA) que tiveram lugar fora de Portugal, os mesmos, quando configurados isoladamente e independentemente de ser ou não conhecida pelos agentes a finalidade do apoio médico prestado”, “não entram no conceito de “técnicas de PMA”, lê-se no parecer de Janeiro. Acrescenta-se ainda que, mesmo que os centros permitam o recurso a técnicas de PMA a mulheres solteiras, tal “não constitui a prática de um crime mas tão só uma contraordenação.”
Na esmagadora maioria destes casos tudo decorre “de forma tranquila. É aberto o processo de averiguação oficiosa da paternidade mas, quando são mostrados papéis da clínica estrangeira onde fizeram a inseminação com recurso a dador anónimo, o processo costuma ser arquivado", conta Isabel Advirta, vice-presidente da ILGA (Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero) e coordenadora das Famílias Arco-Iris. Em muito poucos casos, quando não há documentos do centro estrangeiro, o Ministério Público chega a chamar a mãe para pedir a identificação do dador, refere, mas o processo costuma ficar por ai. É a primeira vez que ouve falar de uma clínica investigada por esta razão.
O ritmo de mulheres portuguesas lésbicas que vão ao estrangeiro engravidar “está a crescer”, nota Isabel Advirta. Estima que nos últimos três a quatro anos mais de 100 mulheres lésbicas tenham ido todos os anos engravidar com recurso a técnicas de procriação medicamente assistida. São lésbicas que vivem em casal com outras mulheres ou que o fazem sozinhas.
O destino mais procurado, por cerca de 80% do total, é Espanha mas algumas vão também a países como o Reino Unido, a Dinamarca ou a Bélgica, isto porque nestes países a partir dos 18 anos a criança tem direito a saber quem foi o seu dador e a contactá-lo, se assim o entender, em Espanha isso é definitivamente proibido. “Cada família estuda antes de tomar a sua decisão”.
Em Portugal, a dádiva de terceiros (quer de esperma ou de ovócitos) é sempre anónima, só se houver suspeita de poderem ser irmãos, podem colocar essa pergunta ao Conselho Nacional da Procriação Medicamente Assistida que responderá apenas sim ou não à pergunta, a outra situação é para pedir dados genéticos do dador, por exemplo, sobre doenças ou predisposições genéticas. Caso a pessoa queira mesmo saber o nome do seu dador terá que avançar com um processo para tribunal, explica o presidente do CNPMA, Eurico Reis. Nenhuma destas situações terá ainda acontecido.

Uma em cada 14 mulheres já foi vítima de abuso sexual


por Lusa, texto publicado por Isaltina PadrãoOntem11 comentários
Uma em cada 14 mulheres já foi, pelo menos uma vez, vítima de abuso sexual por parte de alguém que não o seu parceiro, revela um estudo realizado em 56 países e hoje publicado na revista The Lancet.
A estimativa sugere que a situação varia muito de país para país, com a taxa de mulheres vítimas de abusos a atingir 20% na região central da África subsaariana, mas em média 7,2% das mulheres com 15 anos ou mais afirmam ter sido atacadas sexualmente pelo menos uma vez na vida.
"Descobrimos que a violência sexual é uma experiência comum para as mulheres em todo o mundo, e em algumas regiões é endémica, atingindo mais de 15% em quatro regiões. No entanto, as variações regionais precisam de ser interpretadas com cautela devido às diferenças na disponibilidade dos dados e nos níveis de denúncia", explicou Naeemah Abrahams, do Conselho de Investigação Médica da África do Sul, que liderou o trabalho com colegas da Escola de Higiene e Medicina tropical de Londres e com a Organização Mundial de saúde.
Após procurar estudos publicados ao longo de 13 anos (1998--2011) com dados sobre a prevalência global de violência sexual, os cientistas identificaram 77 estudos válidos, recolhendo dados sobre 412 estimativas em 56 países.
Os resultados mostram que as mais altas taxas de violência sexual surgem no centro da África subsaariana (21% na República Democrática do Congo), no sul da mesma região (17,4% na Namíbia, África do Sul e Zimbabué), e na Oceânia (16,4% na Nova Zelândia e Austrália).
Os países do Norte de África e Médio Oriente (4,5% na Turquia) e no sul da Ásia (3,3% na Índia e Bangladesh) registaram as taxas mais baixas.