terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Insultos e agressões fizeram parte da vida de João durante 20 anos



22 de Fevereiro, 2014
Cenas de ciúmes constantes, depois insultos, humilhações, até às agressões físicas, numa relação de cedência permanente, levaram João, professor universitário, a ser um dos poucos homens a assumir-se como vítima de violência doméstica.João Paiva conheceu Fernanda ainda no 9.º ano, tinham então 13 anos. Reencontram-se na faculdade e começam a namorar aos 19, vivendo uma relação que haveria de terminar quando ele já tem 40 anos, recheada de episódios de "manipulação" e de "violência psicológica forte".
As cenas de ciúmes apareciam com "muita frequência" e com elas vinham também o isolamento e o afastamento da família e dos amigos mais próximos.
Quando a filha tinha cinco anos, passam por uma primeira "grande crise" e o facto de Fernanda estar "sob muito 'stress'" para entregar a tese de doutoramento foi servindo de desculpa para João "ignorar o tratamento inadmissível" a que foi sujeito.
A socióloga Cláudia Casimiro, com investigação feita na área da violência feminina, explicou à Lusa que a violência praticada pelas mulheres é mais escondida e feita de uma forma gradual, podendo passar por isolar o marido da família ou dos amigos, chantagear, humilhar, rebaixar, por a sua masculinidade em causa.
"Toda a minha vida foi de cedências e quando olho para trás, vejo que essa cedência não acontecia de uma forma inocente. Era-me feito sentir que eu tinha de ceder. As prioridades dela estavam primeiro, mas depois eu era tratado como se não tivesse querido fazer ou não tivesse sido capaz", adianta o João.
João chegou até a abdicar de uma bolsa de doutoramento na Suíça. Noutra altura, aceitou prescindir de quase 90% do ordenado para ser Fernanda a gerir.
À Lusa, Luísa Waldherr, psicóloga clínica da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), explicou que a dinâmica da mulher agressora passa pela violência psicológica.
"A certa altura, a auto-estima está de tal forma em baixo, eles entram em processos depressivos e, a partir daí, é relativamente fácil passar à agressão física porque ele deixa de ter força anímica para resistir", adiantou.
E foi isso que aconteceu com João: durante 2008, o mau estar acentua-se e as humilhações e os maus tratos aumentam, tendo havido "sessões de maus tratos físicos". Tudo isto dentro da sua própria casa e numa das situações à frente da filha menor.
Certa noite, depois de mais uma discussão, João sai para apanhar ar. Quando volta encontra a porta trancada. Minutos depois chega uma brigada da GNR porque Fernanda tinha apresentado queixa por violência doméstica. Separam-se, mas os problemas estão longe de acabar.
A partir daqui, vêem as dificuldades para conseguir estar com os filhos, ao mesmo tempo que João se apercebe que Fernanda vai minando a relação dos filhos com o pai.
Depois, vem a violência física, quando João se confronta com Fernanda em casa de uma amiga comum.
"Chega e começa a insultar-me", recorda. João tenta responder, mas Fernanda não quer ouvir. A amiga pede-lhe que o oiça, mas leva um grito como resposta e quando João sugere que a mulher precisa de "outro tipo de tratamento" leva com um soco na cara.
Recua, tropeça e cai de costas. "Ela vem a correr em direcção a mim e começa a pontapear-me e eu fico ali a levar pontapés no tórax, na cabeça".
João apresenta queixa na polícia, mas Fernanda também. Ambos recebem assistência hospitalar. Cerca de seis meses depois são chamados pelo Ministério Público. São constituídos arguidos por ofensas à integridade física.
Depois de um julgamento "muito demorado", que começa em Dezembro de 2012, a leitura da sentença sai em Julho: "Sou ilibado de tudo o que era acusado e ela é condenada".
O julgamento terminou, mas as agressões continuam porque Fernanda "faz agressão psicológica através dos dois filhos".
Desde essa altura que João não está com a filha mais velha. Em relação ao filho mais novo a guarda é partilhada.
"Vou fazendo tudo o que posso pela minha filha. Enquanto tiver forças. Mas já são poucas".
Hoje assinala-se o Dia Europeu das Vítimas de Crime.
Lusa/SOL

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