quarta-feira, 16 de abril de 2014

Nas aulas sempre ligados à Net inShare4



Ana Isabel, de 17 anos, não tem dúvidas de que se não fossem as cábulas no telemóvel nunca teria passado do 10 a Filosofia. “Usei mensagens no Facebook para escrever a matéria. E durante o teste tive sempre o telemóvel entre os joelhos. De tempos a tempos consultava-as”, conta a aluna do 12.º ano de um liceu de Lisboa, para quem a nota no ano anterior poderia ter comprometido a média escolar. “Consegui ter 12 ou 13 nesse teste”, recorda. Na sua turma, quando alguém falta a uma aula o problema é rapidamente resolvido. Em vez de fotocopiar os apontamentos dos colegas, os alunos tiram fotografias com os telemóveis às páginas do caderno e, se for preciso, imprimem-nas e usam-nas para estudar. As novas tecnologias, da internet aos telemóveis, vieram revolucionar o dia-a-dia de estudantes e professores.
Aliás, o acesso às redes sociais é de tal forma grande que, há duas semanas, o Ministério da Educação optou por bloquear o acesso das escolas públicas ao Facebook e ao Instagram, e dificultou a navegação no Youtube, no período até à hora do almoço, para aumentar a velocidade da net nos estabelecimentos de ensino.
Depois da chuva de críticas que se seguiu, de directores de escolas e professores, o Ministério admite agora que o bloqueio pode ser temporário. “As restrições são para aplicar pelo menos até à celebração de um novo contrato de fornecimento de internet”, que visa aumentar a capacidade de rede disponível - esclareceu ao SOL fonte oficial do ministério liderado por Nuno Crato.
Turmas no Facebook
A decisão de condicionar o acesso àqueles sites apanhou professores e alunos de surpresa porque o uso da internet nas escolas é generalizado.
Aliás, nas aulas, é comum o recurso a redes sociais ou a vídeos do Youtube para dar a matéria ou para a ilustrar com imagens. “Este ano, a professora de Físico-química já usou vídeos no quadro electrónico para mostrar o sistema solar”, conta Pedro, de 12 anos, no 7.º do Liceu Rainha D. Amélia, em Lisboa.
Mas a utilização da net no meio escolar não se restringe às salas de aula: hoje são cada vez mais os estudantes e professores que trocam informações nas redes sociais ou através de e-mails. “Na nossa turma temos um grupo fechado no Facebook, onde os professores nos enviam fichas ou exercícios para fazermos em casa e onde podemos tirar dúvidas sobre trabalhos”, explica Rita, de 14 anos, que estuda numa secundária em Cascais.
É também para tirar dúvidas que a turma do 12.º ano do curso de joalharia na secundária António Arroio, em Lisboa, criou um grupo semelhante. “Se preciso de saber alguma matéria dada, peço-a à delegada de turma que me envia a informação através do Facebook”, explica Laura, de 19 anos, acrescentando que assim todos podem estar actualizados. A página é também usada para professores e alunos trocarem informações sobre exposições importantes.
Os trabalhos em casa também são feitos, hoje em dia, através da internet. “Ainda no fim-de-semana passado tinha de fazer um trabalho de grupo. Como uma colega minha tinha de ir para fora de Lisboa, fizemos o trabalho por Skype” (o software que possibilita comunicações de voz e vídeo através da net), conta Maria, de 17 anos, aluna do 11.º ano de um liceu da capital.
Segundo dados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos divulgados no início da semana, 96% dos estudantes portugueses já têm computador em casa. E o facto de muitas famílias terem prescindido da net, devido à crise, leva os jovens a socorrem-se dos computadores e da rede wireless das instituições.
Telemóveis à solta nas salas de aula
Outra aluna da António Arroio conta ao SOL que quase metade da turma “está agarrada” ao telemóvel durante as aulas, apesar de a utilização dos aparelhos nas salas estar proibida pelo Estatuto do Aluno há dois anos, para dar resposta a casos como o revelado em 2009, num polémico vídeo em que se via uma estudante a agredir a professora na sala de aula por esta lhe ter tirado o telemóvel. “Os professores pedem-nos para desligarmos os telemóveis, mas nós colocamo-los apenas no silêncio e usamo-los para trocar sms entre nós”, confessa a estudante da António Arroio.
Também há quem se aproveite das distracções do professor para fotografar dentro da sala. “No outro dia recebi uma foto de um colega que estava a dormir na aula”, conta Maria, que em Fevereiro chegou a enviar dois mil sms em apenas três dias, esgotando o seu plafond mensal.
As escolas têm formas diferentes de controlar os abusos. Na Eugénio dos Santos, em Lisboa, há professores que obrigam os alunos a entregar o telemóvel logo no início da aula. Se não o fizerem levam falta de comportamento. E há até quem já tenha feito vistoria aos estudantes do 5.º ano.
Noutros estabelecimentos de ensino, logo pela manhã, os telemóveis são colocados em caixas, só sendo devolvidos aos alunos nos intervalos. Noutras têm de ser guardados durante as aulas e, caso um estudante seja apanhado a violar as regras, arrisca-se a uma falta disciplinar e a ficar com o telemóvel apreendido.
É o caso da Inês de Castro, em Gaia, onde os aparelhos retirados nas aulas acabam na mesa do director, Agostinho Guedes. “O telemóvel chega à direcção e só é devolvido depois de os pais serem chamados à escola e juntamente com o aluno discutirem a violação das regras”, adianta o responsável do agrupamento, acrescentando que já teve várias situações destas.
Jogos e filmes no recreio
Aos 10 anos, Beatriz quer que os pais lhe instalem no telemóvel a rede de chat Whatsapp, para poder falar com as colegas de turma. Na escola Eugénio dos Santos, os recreios da aluna do 5.º são passados com as amigas a ver filmes ou a ouvir música através da internet. É com jogos como os Angry Birds ou o Candy Crash que muitos ocupam os intervalos.
Apesar de reconhecer que não consegue viver sem telemóvel, Ana considera que o vicio pela net leva a que muitas vezes os alunos acabem por não conviver tanto nos intervalos do Liceu Pedro Nunes. “Às vezes é muito irritante”, lamenta, explicando: “Estamos todos no intervalo em grupo e há três ou quatro pessoas alheadas a jogar. No outro dia até me chateei com um amigo por causa disso, acabámos por não falar”.
A aluna admite, porém, que é a primeira a andar com o telefone na mão para todo o lado, e que grande parte do seu dia é passado a comunicar com amigas da escola através de sms para saber onde estão, se querem ir ao bar ou se já acabaram as aulas e vão para casa. E mesmo para se informar se o autocarro demora muito tempo usa o telemóvel. Envia uma mensagem para o número disponível na paragem em frente ao Pedro Nunes e pouco depois recebe no telemóvel um sms com os minutos que faltam para chegar o transporte que a leva a casa.
joana.f.costa@sol.pt

Nenhum comentário:

Postar um comentário