quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Chimpanzé em busca do direito de ser pessoa jurídica


Ação em tribunal dos EUA pede «habeas corpus» para libertar primata em cativeiro

Uma organização não-governamental norte-americana, de defesa dos direitos dos animais, entrou na segunda-feira com um processo no Supremo Tribunal de Nova Iorque para que reconheça um chimpanzé como «pessoa legal». Num pedido inédito de habeas corpus para um animal não-humano, a Nonhumam Rights Project argumenta que o primata, de nome Tommy, reúne os requisitos para que lhe seja dado o direito à liberdade.

De acordo com a BBC, a interposição do processo judicial tem por objetivo libertar macacos de cativeiro. A organização pretende fazer o mesmo pedido de habeas corpus para outros três chimpanzés em cativeiro localizados no Estado de Nova Iorque. O objetivo é levá-los depois para um santuário que integra a Aliança de Santuário de Primatas Americanos.

«Pessoa» é a palavra-chave

O habeas corpus é uma figura jurídica, normalmente um direito constitucional, para assegurar que qualquer pessoa detida ilegalmente seja libertada. A palavra-chave aqui é «pessoa». Os animais não-humanos estão cada vez mais protegidos legalmente, mas o Nonhuman Rights Project quer que alguns deixem de ser considerados como coisas.

«Um ser como Tommy, que possui autonomia, auto-determinação, auto-consciência e capacidade de escolher como quer viver, deve ser reconhecido pela lei comum como "pessoa", com o direito legal à liberdade física», argumenta a ação interposta no Supremo Tribunal.

A questão, acrescenta o documento, «não é se Tommy é ou não um ser humano, e não é, mas se, tal como um ser humano, é uma "pessoa legal" perante as leis de Nova Iorque».

Se o tribunal aceitar o pedido, Tommy deixará o minúsculo cubículo onde tem vivido nos últimos anos. E ter-se-á aberto uma nova frente na evolução dos direitos dos animais. Tommy é um chimpanzé de 26 anos, enjaulado em Gloversville, no Estado de Nova Iorque.

Paralelo com os escravos do passado

Numa entrevista dada esta quarta-feira à BBC Radio 4, o jurista Steven Wise, fundador do Nonhumam Rights Project, explica que a ação judicial é o culminar de anos de trabalho e investigação em defesa dos animais. Wise traça um paralelo entre a situação de certos animais, como os grandes primatas, e a dos escravos no passado.

«Não há muito tempo, as pessoas concordavam que os escravos humanos não podiam ser pessoas legais, mas eram simplesmente propriedade dos donos», afirma.

A própria iniciativa legal agora lançada inspira-se num caso de 1772, na Inglaterra, quando um juiz aceitou um pedido de habeas corpus para um escravo foragido, que estava preso, acorrentado e pronto a ser enviado para a Jamaica para ser revendido. O juiz, Lord Mansfield, concordou com o argumento de que o escravo James Somerset não era uma «coisa» mas sim uma pessoa, e libertou-o décadas antes da abolição da escravatura na Inglaterra e nos EUA.

«A classificação de Tommy como uma "coisa legal" ao invés de uma "pessoa legal" baseia-se no objetivo ilegítimo de escravizá-lo», sustenta o pedido da Nonhumam Rights Project.

Desde 2007 que a organização tem vindo a trabalhar nos argumentos deste processo para equiparar um animal a uma pessoa. Advogados, estudantes de Direito, cientistas e outros especialistas estiveram envolvidos no trabalho. Um levantamento completo das normas e jurisprudência em cada Estado dos EUA permitiu identificar os tribunais mais recetivos a uma causa como aquela.

Só depois de escolhido o Estado em que seria interposta a ação é que se foi atrás dos animais que seriam os protagonistas. Os candidatos estavam entre os que são tidos como especialmente inteligentes, como elefantes, orcas, golfinhos ou primatas. A escolha recaiu sobre os chimpanzés, pois havia alternativas de alojamento em centros de acolhimento, caso venham a ser libertados.

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