Ana
Isabel, de 17 anos, não tem dúvidas de que se não fossem as cábulas no
telemóvel nunca teria passado do 10 a Filosofia. “Usei mensagens no
Facebook para escrever a matéria. E durante o teste tive sempre o
telemóvel entre os joelhos. De tempos a tempos consultava-as”, conta a
aluna do 12.º ano de um liceu de Lisboa, para quem a nota no ano
anterior poderia ter comprometido a média escolar. “Consegui ter 12 ou
13 nesse teste”, recorda. Na sua turma, quando alguém falta a uma
aula o problema é rapidamente resolvido. Em vez de fotocopiar os
apontamentos dos colegas, os alunos tiram fotografias com os telemóveis
às páginas do caderno e, se for preciso, imprimem-nas e usam-nas para
estudar. As novas tecnologias, da internet aos telemóveis, vieram
revolucionar o dia-a-dia de estudantes e professores.
Aliás, o
acesso às redes sociais é de tal forma grande que, há duas semanas, o
Ministério da Educação optou por bloquear o acesso das escolas públicas
ao Facebook e ao Instagram, e dificultou a navegação no Youtube, no
período até à hora do almoço, para aumentar a velocidade da net nos
estabelecimentos de ensino.
Depois da chuva de críticas que se
seguiu, de directores de escolas e professores, o Ministério admite
agora que o bloqueio pode ser temporário. “As restrições são para
aplicar pelo menos até à celebração de um novo contrato de fornecimento
de internet”, que visa aumentar a capacidade de rede disponível -
esclareceu ao SOL fonte oficial do ministério liderado por Nuno Crato.
Turmas no Facebook
A
decisão de condicionar o acesso àqueles sites apanhou professores e
alunos de surpresa porque o uso da internet nas escolas é generalizado.
Aliás,
nas aulas, é comum o recurso a redes sociais ou a vídeos do Youtube
para dar a matéria ou para a ilustrar com imagens. “Este ano, a
professora de Físico-química já usou vídeos no quadro electrónico para
mostrar o sistema solar”, conta Pedro, de 12 anos, no 7.º do Liceu
Rainha D. Amélia, em Lisboa.
Mas a utilização da net no meio
escolar não se restringe às salas de aula: hoje são cada vez mais os
estudantes e professores que trocam informações nas redes sociais ou
através de e-mails. “Na nossa turma temos um grupo fechado no Facebook,
onde os professores nos enviam fichas ou exercícios para fazermos em
casa e onde podemos tirar dúvidas sobre trabalhos”, explica Rita, de 14
anos, que estuda numa secundária em Cascais.
É também para tirar
dúvidas que a turma do 12.º ano do curso de joalharia na secundária
António Arroio, em Lisboa, criou um grupo semelhante. “Se preciso de
saber alguma matéria dada, peço-a à delegada de turma que me envia a
informação através do Facebook”, explica Laura, de 19 anos,
acrescentando que assim todos podem estar actualizados. A página é
também usada para professores e alunos trocarem informações sobre
exposições importantes.
Os trabalhos em casa também são feitos,
hoje em dia, através da internet. “Ainda no fim-de-semana passado tinha
de fazer um trabalho de grupo. Como uma colega minha tinha de ir para
fora de Lisboa, fizemos o trabalho por Skype” (o software que
possibilita comunicações de voz e vídeo através da net), conta Maria, de
17 anos, aluna do 11.º ano de um liceu da capital.
Segundo dados
do Programa Internacional de Avaliação de Alunos divulgados no início da
semana, 96% dos estudantes portugueses já têm computador em casa. E o
facto de muitas famílias terem prescindido da net, devido à crise, leva
os jovens a socorrem-se dos computadores e da rede wireless das
instituições.
Telemóveis à solta nas salas de aula
Outra
aluna da António Arroio conta ao SOL que quase metade da turma “está
agarrada” ao telemóvel durante as aulas, apesar de a utilização dos
aparelhos nas salas estar proibida pelo Estatuto do Aluno há dois anos,
para dar resposta a casos como o revelado em 2009, num polémico vídeo em
que se via uma estudante a agredir a professora na sala de aula por
esta lhe ter tirado o telemóvel. “Os professores pedem-nos para
desligarmos os telemóveis, mas nós colocamo-los apenas no silêncio e
usamo-los para trocar sms entre nós”, confessa a estudante da António
Arroio.
Também há quem se aproveite das distracções do professor
para fotografar dentro da sala. “No outro dia recebi uma foto de um
colega que estava a dormir na aula”, conta Maria, que em Fevereiro
chegou a enviar dois mil sms em apenas três dias, esgotando o seu
plafond mensal.
As escolas têm formas diferentes de controlar os
abusos. Na Eugénio dos Santos, em Lisboa, há professores que obrigam os
alunos a entregar o telemóvel logo no início da aula. Se não o fizerem
levam falta de comportamento. E há até quem já tenha feito vistoria aos
estudantes do 5.º ano.
Noutros estabelecimentos de ensino, logo
pela manhã, os telemóveis são colocados em caixas, só sendo devolvidos
aos alunos nos intervalos. Noutras têm de ser guardados durante as aulas
e, caso um estudante seja apanhado a violar as regras, arrisca-se a uma
falta disciplinar e a ficar com o telemóvel apreendido.
É o caso
da Inês de Castro, em Gaia, onde os aparelhos retirados nas aulas
acabam na mesa do director, Agostinho Guedes. “O telemóvel chega à
direcção e só é devolvido depois de os pais serem chamados à escola e
juntamente com o aluno discutirem a violação das regras”, adianta o
responsável do agrupamento, acrescentando que já teve várias situações
destas.
Jogos e filmes no recreio
Aos 10
anos, Beatriz quer que os pais lhe instalem no telemóvel a rede de chat
Whatsapp, para poder falar com as colegas de turma. Na escola Eugénio
dos Santos, os recreios da aluna do 5.º são passados com as amigas a ver
filmes ou a ouvir música através da internet. É com jogos como os Angry
Birds ou o Candy Crash que muitos ocupam os intervalos.
Apesar
de reconhecer que não consegue viver sem telemóvel, Ana considera que o
vicio pela net leva a que muitas vezes os alunos acabem por não conviver
tanto nos intervalos do Liceu Pedro Nunes. “Às vezes é muito
irritante”, lamenta, explicando: “Estamos todos no intervalo em grupo e
há três ou quatro pessoas alheadas a jogar. No outro dia até me chateei
com um amigo por causa disso, acabámos por não falar”.
A aluna
admite, porém, que é a primeira a andar com o telefone na mão para todo o
lado, e que grande parte do seu dia é passado a comunicar com amigas da
escola através de sms para saber onde estão, se querem ir ao bar ou se
já acabaram as aulas e vão para casa. E mesmo para se informar se o
autocarro demora muito tempo usa o telemóvel. Envia uma mensagem para o
número disponível na paragem em frente ao Pedro Nunes e pouco depois
recebe no telemóvel um sms com os minutos que faltam para chegar o
transporte que a leva a casa.
joana.f.costa@sol.pt